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Termo inicial da prescrição da ação individual por dano ambiental

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Advogado Ambiental
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Fundador do escritório Farenzena & Franco. Advogado especialista em Direito Ambiental pela UFPR, pós-graduando em Direito Penal e Processual Penal e idealizador do AdvLabs.

Em termos gerais, pode-se conceituar a prescrição como a perda da pretensão de exigibilidade atribuída a um direito, em consequência de sua não utilização por um determinado período.

Apesar de impor um determinado prejuízo ao interessado, em razão de sua inércia, seu fundamento reside na paz social e na segurança da ordem jurídica.

Quanto aos elementos constitutivos da prescrição, a doutrina afirma serem necessários os seguintes requisitos:

a) exista o direito material da parte a uma prestação a ser cumprida, a seu tempo, por meio de ação ou omissão do devedor;

b) ocorra a violação desse direito material por parte do obrigado, configurando o inadimplemento da prestação devida;

c) surja, então, a pretensão, como consequência da violação do direito subjetivo, isto é, nasça o poder de exigir a prestação pelas vias judiciais; e finalmente,

d) se verifique a inércia do titular da pretensão em fazê-la exercitar durante o prazo extintivo fixado em lei.[1]

Quanto ao correto termo inicial para a contagem dos prazos legais, como se trata de direito individual, a doutrina utiliza da teoria da actio nata para explicar a aplicação do prazo prescricional, segundo a qual, havendo violação do direito, o prazo para a prescrição começa a correr, invocando-se nesse sentido, o disposto no art. 189 do CC/02:

Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.

O que diz a doutrina

Com fundamento nesse dispositivo legal, muitos autores defendem a posição de que, independentemente do aspecto subjetivo do ofendido, ocorrido o dano, inicia-se o prazo prescricional. Nesse sentido:

A prescrição decorre da conjugação de dois requisitos: a inércia do credor e o decurso do prazo estabelecido em lei. É irrelevante a causa que, no plano psicológico, tenha levado o credor a se omitir.

Não cabe qualquer indagação acerca de ter ou não o devedor se conduzido de boa ou má-fé, ao deixar de cumprir a obrigação durante o lapso temporal.[2]

A existência de ação exercitável é o objeto da prescrição. Tendo em vista a violação de um direito, a ação tem por fim eliminar os efeitos dessa violação.

Violado o direito, surge a pretensão. A ação prescreverá se o interessado não promovê-la. Tão logo surge o direito de ação, já começa a correr o prazo de prescrição.[3]

Para que nasça a pretensão não é pressuposto necessário que o titular do direito conheça a existência do direito, ou a sua natureza, ou a validade, ou eficácia, ou a existência da pretensão nascente, ou da sua extensão em qualidade, quantidade, tempo e lugar da prestação, ou outra modalidade, ou quem seja o obrigado, ou que saiba o titular que a pode exercer.

Por isso, no direito brasileiro, a prescrição trintenal da pretensão a haver indenização por ato ilícito absoluto independe de se saber se houve dano ou quem o causou (…).

O ter o credor conhecido, ou não, a existência do seu direito e pretensão é sem relevância. Nem na tem o fato de o devedor ignorar a pretensão, ou estar de má-fé.[4]

Nessa linha de raciocínio, o art. 189 do CC/02 consagrou o princípio da actio nata, fixando como dies a quo para contagem do prazo prescricional a data em que nasce o direito subjetivo de ação por violação de direito, independentemente da efetiva ciência da vítima (REsp 1.168.336/RJ).

Contagem do prazo prescricional no caso do dano ambiental

No entanto, em algumas hipóteses, a jurisprudência tem excepcionado a regra mencionada no capítulo anterior, a fim de determinar que a contagem do prazo de prescrição ocorra a partir do momento em que o ofendido possua ciência do ato ilícito.

Esse entendimento decorre do fato de que não seria possível esperar que alguém ajuíze ação sem ter ciência do dano sofrido, razão por que o prazo inicial da prescrição somente se inicia pela ciência inequívoca do fato lesivo e que, se a prescrição é uma punição à morosidade ou negligência do titular, não é possível compreendê-la quando a inércia do titular decorre da ignorância da violação.

Assim, o surgimento da pretensão reparatória ocorreria apenas no momento em que o titular do direito violado detém o pleno conhecimento da lesão, termo em que sua pretensão passa a ser, efetivamente, exercitável.

A prescrição segundo a doutrina

Antônio Luiz da Câmara Leal[5] ao se referir sobre prescrição, assim registrou:

Não nos parece racional admitir-se que a prescrição comece a correr sem que o titular do direito violado tenha ciência da violação.

Se a prescrição  é  um castigo à negligência do titular – cum contra desides homines, et sui juris contentores, odiose exceptiones oppositae sunt, – não se compreende a prescrição sem a negligência, e esta, certamente, não se dá, quando a inércia do titular decorre da ignorância da violação.

Exercitar a ação, ignorando a  violação que lhe dá origem,  é racionalmente impossível, e antijurídico seria responsabilizar o titular  por  uma inércia que não lhe pode ser imputada – ad impossibilia nemo tenetur.

Nas ações que nascem do não cumprimento de uma obrigação, denominadas pessoais, porque o direito do titular recai sobre atos do sujeito passivo, que se  obrigara a dar, fazer ou não fazer alguma coisa, não pode o titular ignorar a violação ao seu direito, uma vez que essa consiste na falta de cumprimento da obrigação, e, por isso, o início da prescrição, nas ações pessoais, coincide com o momento em que a obrigação devia ser cumprida e não o foi.

Mas, nas ações que nascem da transgressão da obrigação geral-negativa de respeito ao direito do titular, a que todos estão sujeitos, pode dar-se a violação do direito, sem que dela o titular tenha imediato conhecimento, podendo, mesmo, sua ignorância prolongar-se por muito tempo, como, geralmente, sucede, quando o titular do direito violado se acha ausente do lugar da violação, e não tem ali preposto ou representante que o ponha ao corrente dos fatos.

Todavia, a ignorância não se presume, pelo que ao titular incumbe provar o momento em que teve ciência da violação, para que possa beneficiar-se por essa circunstância, a fim de ser o prazo prescricional contado do montante da ciência, e não da violação.

Logo, tratando-se de dano ambiental individual, a data inicial do período prescritivo é a data da efetiva ciência do dano ambiental sofrido pelo particular.

Ou seja, o termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de indenização por dano moral e material ambiental, conta-se da ciência inequívoca dos efeitos decorrentes do ato lesivo.

[1] Humberto Theodoro Júnior. Comentários ao Novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2ª ed., 2003, vol. III, tomo II, p. 154.

[2] Humberto Theodoro Júnior. Comentários ao Novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2ª ed., 2003, vol. III, tomo II, p. 174.

[3] Sílvio de Salvo Venosa. Direito Civil: parte geral. São Paulo: Atlas, 10ª ed., 2010, p. 565.

[4] Pontes de Mirando. Tratado de Direito Privado. São Paulo: RT, 1983, 4ª ed., tomo VI, p. 117-118

[5] Leal, Antônio Luiz da Câmara. Da Prescrição e da Decadência. 4ª Edição. Editora Forense. Rio de Janeiro. 1982. p. 20-24.

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