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É possível a aplicação do princípio da insignificância em crime ambiental?

Princípio da insignificância. Crime Ambiental. Aplicação. STJ. Jurisprudência. 

Crime Ambiental
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Advogado Ambiental
49222/SC
Fundador do escritório Farenzena & Franco. Advogado especialista em Direito Ambiental pela UFPR, pós-graduando em Direito Penal e Processual Penal e idealizador do AdvLabs.

A ocorrência de um crime de bagatela reflete o entendimento de que o Direito Penal deve intervir somente nos casos em que a conduta ocasionar lesão jurídica de certa gravidade, devendo ser reconhecida a atipicidade material de perturbações jurídicas mínimas ou leves, estas consideradas não só no seu sentido econômico, mas também em função do grau de afetação da ordem social que ocasionem.

Veja-se, sobre o tema, a lição de Cezar Roberto Bitencourt:

O princípio da insignificância foi cunhado pela primeira vez por Claus Roxin, em 1964, que voltou a repeti-lo em sua obra Política Criminal y Sistema del Derecho Penal, partindo do velho adágio latino minima non curat praetor.

A tipicidade penal exige uma ofensa de alguma gravidade a bens jurídicos protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico.

Segundo esse princípio, que Klaus Tiedemann chamou de princípio de bagatela, é imperativa uma efetiva proporcionalidade entre a gravidade da conduta que se pretende punir e a drasticidade da intervenção estatal. Amiúde, condutas que se amoldam a determinado tipo penal, sob o ponto de vista formal, não apresentam nenhuma relevância material.

Nessas circunstâncias, pode-se afastar liminarmente a tipicidade penal porque em verdade o bem jurídico não chegou a ser lesado. (…)

Assim, a irrelevância ou insignificância de determinada conduta deve ser aferida não apenas em relação à importância do bem juridicamente atingido, mas especialmente em razão ao grau de sua intensidade, isto é, pela extensão da lesão produzida, como por exemplo, nas palavras de Roxin, ‘mau-trato não é qualquer tipo de lesão à integridade corporal, mas somente uma lesão relevante; uma forma delitiva de injúria é só a lesão grave a pretensão social de respeito.

Como força deve ser considerada unicamente um obstáculo de certa importância, igualmente também a ameaça deve ser sensível para ultrapassar o umbral da criminalidade”.

Concluindo, a insignificância da ofensa afasta a tipicidade. Mas essa insignificância só pode ser valorada através da consideração global da ordem jurídica.

Como afirma Zaffaroni, “a insignificância só pode surgir à luz da função geral que dá sentido à ordem normativa e, consequentemente, a norma em particular, e que nos indica que esses pressupostos estão excluídos de seu âmbito de proibição, o que resulta impossível se estabelecer à simples luz de sua consideração isolada”.

(Tratado de Direito Penal. Parte Geral 1. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 21/22).

Em se tratando de crime contra o meio ambiente, bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida, consoante previsto no artigo 225 da Constituição Federal, discute-se se seria possível a incidência do mencionado postulado.

Sobre o assunto, Guilherme de Souza Nucci adverte:

Não há dúvida de que a proteção ao meio ambiente é de interesse geral da coletividade, porém, tal perspectiva não elide a possibilidade de se encontrar uma infração de ínfimo potencial ofensivo, cujo alcance é estreito e limitado.

(Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. volume 2. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 548).

No mesmo sentido, os Tribunais reconhecem a atipicidade material de determinadas condutas praticadas em detrimento do meio ambiente, desde que verificada a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada.

Assim, a aplicação do princípio da insignificância, causa excludente da tipicidade material, admitida pela doutrina e pela jurisprudência em observância aos postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Direito Penal, demanda o exame do preenchimento de certos requisitos objetivos e subjetivos, traduzidos no reduzido valor do bem tutelado e na favorabilidade das circunstâncias em que foi cometido o fato criminoso e de suas consequências jurídicas e sociais, pressupostos que, no caso, se encontram atendidos.

Por isso, quando a pesca é realizada com “linha de mão” por exemplo, sem apreensão de nenhum pescado, de maneira que não houve perturbação no ecossistema, é possível reconhecer a atipicidade da conduta e aplicar o princípio da insignificância ou bagatela.

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